OS PESQUISADORES E A ADUNICAMP, POR GERALDO DI GIOVANNI


GERALDO DI GIOVANNI é professor aposentado do Instituto de Economia (IE/Unicamp)
Dia 25 de março próximo haverá uma decisão dos associados da ADUNICAMP sobre a incorporação dos membros da carreira de pesquisadores ao nosso quadro de associados. Assim sendo, gostaria de fazer um encaminhamento contrário à proposta e passo a enumerar minhas razões:
1. Para mim, a representação corporativa, salvo raríssimas exceções, deve se ater a grupos de ocupação perfeitamente definidos, por uma razão muito simples: a especificidade e a incolumidade dos legítimos interesses profissionais das diversas categorias quando são exclusivos deve ser sempre garantida. Dou um exemplo. Sempre balizamos nossas pretensões salariais, nossas cargas horárias, nossos mecanismos de ascensão, pelo que acontece com docentes de universidades públicas, particularmente nas federais. Não tenho certeza se as demais carreiras naquelas universidades, tem a mesma estrutura e dinâmica das carreiras docentes. Pode ser que em alguns casos, sim; pode ser que em algumas conjunturas não. E isso ocorre simplesmente porque, sem nenhuma relação de hierarquia, docentes são docentes e pesquisadores e pesquisadores são pesquisadores. É o mesmo raciocínio que se aplica para a diferenciação entre docentes e outros servidores: carreiras próprias, requisitos profissionais e formais próprios. A ideia de que existe um “parentesco” entre o que fazem os docentes e os pesquisadores da carreira PD me parece falsa. Se formos esmiuçar funções de outras atividades existentes na universidade, em muitas áreas, iríamos nos espantar com tanta proximidade com o que fazemos. Mas, em ambos os casos, seríamos obrigados a constatar a falta de identidade. O que quero dizer é que o fundamento primário para as associações como a nossa ( caráter sindical) nas modernas democracias ainda é a identidade profissional. O pesquisador não é um quase-docente, nem docente.
2. Aqueles que conhecem a minha trajetória na UNICAMP, particularmente nos cargos diretivos que ocupei, sabem que fui uma das pessoas que mais batalhou pela criação da carreira de pesquisador. Minha posição remonta ao início da década de 1980, desde a o início da implantação dos núcleos interdisciplinares de pesquisa que durante um bom tempo coordenei. A dissociação entre as carreiras docente e de pesquisador sempre esteve muito clara para mim. O docente, até por obrigação contratual, é antes de mais nada, antes de também ser pesquisador, um professor. O inverso não é verdadeiro. A carreira foi criada com a intenção de, especialmente nas áreas interdisciplinares, ampliar as áreas de investigação da universidade para campos do conhecimento que fossem além das vocações dos departamentos e unidades. Desde então, ainda no início daquela década, já se tinha na UNICAMP uma ideia clara de que a dinâmica de expansão da investigação científica no mundo todo, era muito diferente da expansão do ensino e da extensão.
3. Assisti com interesse o vídeo publicado pela nossa ADUNICAMP no qual a titular da COCEN defende a incorporação. Ela não usou sequer um argumento de natureza, conjuntura ou fundamentação científicas que justificassem a proposta. Usou sim relevantes razões de natureza política – com as quais eu concordo – embora ache que seria, nesse sentido, muito mais eficaz a criação de uma associação do pesquisadores que pudesse se juntar à ADUNICAMP e outras entidades nas lutas a que ela se refere. É claro que reconheço também o fundamento político institucional e político em geral na constituição e desenvolvimento de associações. É óbvio que um número maior de associados é um recurso de poder.
4. Penso que em casos como o de agora, faz necessária uma certa prudência. Se em certos momentos, os interesses legítimos de docentes e pesquisadores possam estar alinhados no interior na Universidade, sabemos que as coisas não serão sempre assim. As dinâmicas das políticas institucionais não são uniformes, as conjunturas diversas se sucedem. Isso vai desde distribuição de recursos orçamentários, até a complexa divisão do trabalho acadêmico e tantos outros temas geradores de propensão ao conflito.
5. Necessária se faz ainda a mesma prudência jurídica na incorporação de novos associados. Merece atenção o disposto no artigo 2o de nossos Estatutos, bem como seus três parágrafos que definem com clareza os requisitos para nossa participação sindical. É da observância dessas normas que decorre a legalidade e a legitimidade de nossas decisões. Já tive oportunidade de expressar posição semelhante em público, quando falei a respeito às pautas de reivindicação conjunta no Fórum das Seis, quando fui contestado de modo veemente pelo nosso Presidente Wagner Romão. Embora tal coalizão tivesse justificações políticas no momento em que foi criado, na minha opinião, isso dificultou a emergência de pautas tipicamente docentes ao longo da história recente do movimento. Tenho receio que isso possa se repetir no âmbito interno de nossa associação. Receio também que, em conjunturas políticas especiais as discussões possam ser alteradas por posições externas ao nosso âmbito.
Recebi algumas críticas de amigos a quem apresentei essas ideias. Uma delas é que estou tratando de um problema “menor” diante da gravidade das situação presente e das ameaças que pairam sobre o futuro de nossas universidade. Estou plenamente consciente e acompanho estas questões com preocupação crescente, lado a lado com meus colegas inativos e ativos da UNICAMP e de outras universidades. Afinal de contas, ajudei a construir essa universidade e não pretendo deixar que as atuais tentativas de desmonte avancem. Mas isto é matéria para outras discussões.


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