Professores da FCM questionam proposta de fim do convênio Unicamp/HES


A Secretaria de Estado da Saúde do governo paulista de Tarcísio de Freitas anunciou e começa a colocar em prática a controvertida proposta de por fim ao convênio entre a Unicamp e o HES (Hospital Estadual de Sumaré), que está em vigor há 25 anos. Além de reportagem sobre o tema publicada nesta segunda-feira, 10 de março (leia aqui), a ADunicamp entrevistou dois professores da FCM (Faculdade de Ciências Médicas), que têm bastante proximidade com o HES, para tratar do assunto. São eles o professor Erich Vinicius de Paula, diretor associado da FCM, e o professor Edison Bueno, médico sanitarista do Departamento de Saúde Coletiva da FCM. Confira:

Entrevista com o Professor Erich Vinicius de Paula

ADunicamp – Quais os impactos que a não renovação do convênio poderia causar no atendimento, na saúde pública da região e também no ensino na FCM?

Erich Vinicius de Paula – No ensino os impactos seriam dramáticos, com a perda de importantes cenários de ensino prático para alunos dos cursos de medicina e enfermagem, além de alunos da residência médica. Nosso complexo hospitalar, por ter como característica a alta complexidade, precisa de apoio de hospitais chamados “secundários” para que a formação de nossos alunos e médicos seja mais completa, e atenda as Diretrizes Curriculares Nacionais. Para a assistência, o HES atua com excelência, atestada por premiações e certificações no SUS da região. Ademais, a conexão com a Unicamp torna ainda mais eficiente o referenciamento entre HC e CAISM e HES, otimizando os recursos hospitalares para a região.

Qual o papel da Unicamp na gestão do HES?

Existe a participação no setor administrativo, mas a principal contribuição da Unicamp é na participação de seus docentes e pesquisadores no apoio técnico e científico do HES. E a proximidade dada ao HES desses e outros profissionais da área de saúde da Unicamp para a qualificação da assistência. O que o torna um espaço de ensino e de geração de conhecimento. Esse envolvimento com a Unicamp é muito importante. Outro aspecto que é muito importante é a proximidade com os médicos que também trabalham no Hospital de Clínicas da Unicamp. Essa aproximação permite a maximização do que a gente chama de regulação. De modo que a transferência de pacientes, o uso da rede como um todo de forma eficiente. Porque a rede é complementar. E isso é bom para o conjunto do atendimento.

Se ocorresse uma eventual saída da Unicamp, haveria alguma outra proposta para a Universidade seguir participando na área de assistência?

Não saberíamos dizer o que ocorreria, e não trabalhamos com este cenário. O que podemos afirmar é que tentativas por parte da FCM de inserir atividades de ensino em outros equipamentos de saúde gerenciados por OSs que não eram ligadas à Unicamp não foram bem sucedidas. O que faz com que não trabalhemos com este cenário.

A direção da FCM já tem um posicionamento manifesto sobre essa proposta do governo do Estado?

A direção da FCM aprovou uma moção de apoio à busca de soluções que permitam a manutenção do convênio, bem como garantias de sua perenização, a qual foi aprovada por unanimidade na reunião do último dia 28 de fevereiro. Esta moção será encaminhada ao governador do estado de São Paulo. Além disso, temos participado de uma série de outras atividades para informar as partes envolvidas sobre este processo, sempre buscando propor soluções que contemplem a qualidade de nosso ensino e da assistência regional, em consonância com as premissas do SUS que estabelecem seus equipamentos como cenários de formação para profissionais de saúde. A partir dos contatos que temos realizados com gestores e representantes políticos do estado, acreditamos que uma solução será encontrada.

Entrevista com o Professor Edison Bueno

ADunicamp – O Governo do Estado afirma que irá fazer o chamamento para Organizações Sociais por obrigação legal. A única alternativa é essa ou o convênio poderia ser renovado legalmente com a Unicamp?

Edison Bueno – Não existe nenhuma obrigatoriedade de fazer o certame, então essa é uma informação, no mínimo, equivocada. Também ocorreram comentários de que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) fez essa recomendação. Mas o TCE não faz esse tipo de recomendação. Não cabe a ele fazer isso. O TCE analisa as contas, mas não cabe a ele indicar qual o tipo de contrato que deve ser feito. E também tem uma coisa básica: a relação entre órgãos públicos, sempre se dá através de convênios. E como uma OS não é um ente público, aí entra aquela coisa que a gente precisa entender: na esfera pública a gente faz tudo aquilo que a lei determina; na esfera privada tudo aquilo que a lei permite. E o fato, neste caso, é que a lei permite que uma OS privada e sem fins lucrativas faça a gestão de um hospital público. Mas existe um preceito constitucional determinando que, quando se trata da gestão de um órgão público por outro órgão, é um órgão público o que tem prioridade.

A Unicamp, que não é uma OS teria condições de participar deste chamamento?

A Unicamp nunca vai se tornar uma organização social porque ela é um entre público, uma autarquia estadual. Então, se fosse o caso, seria através de uma de suas instituições de apoio, a Funcamp ou a Fascamp, mas as duas teriam que se certificar como organização social também. Mas o ponto principal não é esse. É a questão financeira. Qual o interesse de ter uma OS na administração de um hospital como o HES. Mesmo que ela se declare sem fins lucrativos, alguém ganha. E quem vai ter um ganho maior aí são os dirigentes desta OS. E também existe a possibilidade de terceirização e quarteirização, o que se aproxima mais do modelo privado de gestão.

Quais são, na tua opinião, os riscos para a gestão do hospital e, como consequência, para a saúde pública da região, caso a gestão do HES deixe de ser executada pela Unicamp?

O que eu tenho defendido, o que conversamos já na congregação da Faculdade de Ciências Médicas e também com dirigentes do Hospital de Sumaré, é que o hospital está certificado como hospital de ensino, então ele é um hospital universitário. E assim não tem o menor sentido que ele deixe de ter a gestão da Unicamp. Não tem sentido, pois até existe um repasse mais favorável por parte do Ministério da Saúde. Então, a Unicamp saindo, deixa de ser um hospital de ensino. Eu até avalio que seria importante formalizar o HES como Hospital Universitário de Sumaré. Pode parecer um detalhe mínimo, mas veja que tanto em São Paulo como em Ribeirão Preto, por exemplo, quem faz a gestão de hospitais públicos estaduais são as universidades. Esses dois estão a cargo da USP e o de Botucatu é gerenciado pela UNESP. Então fica estranha essa história de que todo o trabalho da Unicamp, desenvolvido em mais de duas décadas, vá para um ente privado. E temos que lembrar que não foi a Unicamp que pediu isso. Lá no início, o hospital de Sumaré que estava sob intervenção, passando por uma crise. E a Unicamp foi convidada, foi convocada, para fazer esse trabalho, manter o hospital em funcionamento e o transformou em um hospital universitário. E é um hospital que vem sendo muito bem gerido pela Unicamp. Já recebeu diversas premiações. E a verdade é a seguinte: existem interesses em jogo, interesses que não consideram em primeiro lugar a qualidade dos serviços. E essa história de que você pode ter lá um hospital bom e barato, isso não existe. Seria uma leviandade dizer que qualquer OS faria uma má gestão se assumisse o HES. Mas acho muito difícil que uma OS faça o mesmo trabalho com a qualidade que a Unicamp tem feito nestes anos todos. O HES é um hospital universitário, então como uma organização que não seja uma universidade de qualidade poderia fazer uma boa gestão? São outros mecanismos, as metas são outras, os parâmetros de qualidade que se espera são outros, e neste ponto o hospital de Sumaré tem sido certificado e premiado, tem todas as certificações que existem com relação à qualidade da assistência hospitalar, inclusive internacionais.


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