Reunido em 12/7/2023, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo reconheceu o direito à contagem dos tempos congelados para o funcionalismo público durante a pandemia de Covid-19.
Na votação, provocada por solicitação das prefeituras dos municípios de Irapuã e Sales (nºs 6395.989.23-9 e 6449.989.23-5), os conselheiros do TCE adotam a mesma postura já definida em tribunais de contas de outros estados, e definem que a Lei Complementar (LC) 173/2020 possui eficácia temporária, uma vez que se trata de norma geral de direito financeiro, ou seja, não tem o poder de interferir em benefícios estatutários do funcionalismo público.
Desta forma, segundo o TCE, cessada a vigência da lei, em 31/12/2021, o tempo de serviço computado entre 28/5/2020 e 31/12/2021 deve ser considerado para todos os fins (como é o caso do quinquênio, sexta-parte, licença-prêmio e outros adicionais de tempo). A decisão diz, no entanto, que não pode haver pagamentos retroativos a 31/12/2021.
O assunto entrou em discussão e votação em sessão ordinária do tribunal, cuja íntegra pode ser conferida em https://www.youtube.com/watch?v=v1kMiL6LWac. O voto do relator (conselheiro Renato Martins Costa) e a deliberação do Tribunal de Contas aparecem a partir de 1h23’50”.
É importante destacar que a decisão do TCE é de caráter administrativo e não judicial. Ou seja, ela não obriga os entes públicos a devolverem os tempos, mas deixa claro que poderão fazê-lo sem incorrer no risco de improbidade administrativa, uma vez que a LC 173/2020 é de caráter financeiro e com vigência temporal restrita ao período da crise.
A granada no bolso do funcionalismo
A LC 173/2020 foi aprovada no Congresso Nacional para regulamentar o apoio da União aos estados e municípios por conta da queda da atividade econômica durante a pandemia. O então ministro Paulo Guedes aproveitou a oportunidade e, em suas palavras, colocou “uma granada no bolso do funcionalismo”, determinando o congelamento de reajustes de salários e benefícios, de contratações e de tempos aquisitivos (para fins de quinquênios, sexta-parte, licenças-prêmio e similares) de 28/5/2020 a 31/12/2021. As medidas constam no artigo 8º da lei.
Posteriormente, em 9 março de 2022, o Congresso aprovou a Lei Complementar (LC) 191, que restabeleceu a contagem deste tempo para servidores públicos civis e militares das áreas da saúde e da segurança pública, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. As demais categorias continuaram no prejuízo.
Parecer jurídico
As assessorias jurídicas da Adunesp, Adusp e Adunicamp elaboraram um parecer sobre a decisão do TCE. O texto lembra que LC 173/2020 teve sua legalidade questionada por diversas categorias, entre elas as das universidades estaduais paulistas. Nos processos promovidos pela Adunesp e Adusp, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) acolheu a tese dessas entidades, mas tal decisão foi reformada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que entendeu pela constitucionalidade da norma impugnada. Os processos promovidos pelas outras entidades que integram o Fórum não chegaram a ser julgados pelo TJSP.
O parecer ressalta que, frente à consulta das prefeituras citadas no início desta matéria, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo entendeu que, após três anos, seria justificável uma nova reflexão, com novos enfoques sobre o tema. Em sua decisão, o TCE destaca que, ao reconhecer a constitucionalidade da LC 173, o STF ratificou a natureza financeira da lei complementar, sem prejudicar ou modificar os regimes jurídicos dos servidores públicos. Ou seja, sendo de direito financeiro, por excelência, a LC 173 teve sua modulação circunscrita no tempo de crise aguda, de tal forma que suas disposições demandariam avaliação no exato contexto do desequilíbrio das finanças e incertezas trazidas pela pandemia, sendo um regime fiscal e administrativo excepcional e orientado por disposição transitória de direitos, que em nenhum momento alteraria os regimes jurídicos dos servidores.
Na conclusão do parecer, as AJs das entidades sindicais frisam:
“Considerando que o servidor público estadual manteve íntegra sua atividade laboral nesse interregno de validade de legislação extraordinária, e que a LC 173 é norma de direito financeira excepcional, de vigência temporária segundo o STF, o Tribunal de Contas concluiu que é possível a contagem de tempo desse período para todos os servidores públicos estaduais após o decurso do lapso temporal em que a lei esteve em vigor e para todos os efeitos jurídicos, vedada tão somente a produção de efeitos financeiros no período previsto na LC 173 e que cada órgão deve deliberar a implementação dessa conclusão, de acordo com as suas disponibilidades financeiras, orçamentárias e com respeito à lei de responsabilidade fiscal.”
Cobrança aos reitores
Desde 2020, entidades sindicais de todo o país vêm reivindicando a devolução dos tempos confiscados. O Fórum das Seis cobrou insistentemente o Cruesp sobre o tema.
Tanto no Congresso Nacional, quanto na Assembleia Legislativa de SP (Alesp), há vários projetos solicitando a restituição dos tempos congelados para todas as categorias do funcionalismo, mas nenhum avançou ao ponto de votação. A decisão do Tribunal de Contas do Estado de SP é um fato novo e muito relevante nesta luta.
Tão logo a decisão da consulta feita ao TCE seja publicada no Diário Oficial do Estado, o Fórum das Seis enviará ofício ao Conselho de Reitores (Cruesp), cobrando que siga a deliberação.
ACESSE O BOLETIM DO FÓRUM DAS SEIS NA VERSÃO PDF AQUI
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