Para que não haja dúvida, nós, signatários deste texto, somos judeus e judias inteiramente a favor da criação de um Estado Palestino que possa existir ao lado do Estado de Israel e lamentamos profundamente a dor e o sofrimento da população de Gaza. Se os vínculos que eventualmente temos com Israel nos fazem sentir com maior intensidade a dor dos israelenses, de modo algum, isto nos leva a deslegitimar ou relativizar o sofrimento dos palestinos. Acreditamos que todas as pessoas têm o direito de viver em paz, com liberdade, dignidade e justiça, em qualquer lugar do mundo. Assim, neste momento tão crítico, sentimos a necessidade de expor algumas reflexões sobre o atual conflito na faixa de Gaza, e tecer comentários sobre algumas manifestações que temos vivenciado.
Tornou-se prática comum a redação de manifestos e abaixo assinados. Por mais que possam parecer inócuos, são maneiras de nos posicionarmos publicamente e mitigarmos a imensa sensação de impotência que experimentamos em diversas situações, nas quais temos pouca possibilidade de interferir. Nesse contexto, o atual conflito tem suscitado inúmeros textos e manifestos, alguns dos quais dizem mais pelas omissões do que pelo que está, de fato, neles escrito. Quando um texto busca resgatar o contexto histórico do conflito em Israel, seja na faixa de Gaza ou em outros países da região, é no mínimo absurdo que inicie essa contextualização histórica em 1948, “esquecendo” de citar que as discussões se deram após o extermínio de mais de seis milhões de judeus pelos Nazistas e seus aliados. É igualmente preocupante que alguns manifestos sequer condenem os ataques terroristas do Hamas, no dia 07 de outubro de 2023, que foram o estopim do atual conflito, e assim sejam coniventes com práticas inaceitáveis para qualquer indivíduo supostamente preocupado com causas humanistas. Pior, nas manifestações em apoio à Palestina têm sido frequentes falas em apoio às ações de terrorismo do grupo Hamas.
A maior preocupação é que essas manifestações reproduzem a retórica antissemita e genocida que o Hamas tem e sempre teve. A retórica do Hamas é assumidamente construída com base em um discurso de morte, como pode ser verificado em diversas entrevistas concedidas por seus membros e no próprio estatuto do grupo [1]. No dia 7 de outubro de 2023, o Hamas provou que a conclamação ao genocídio não é apenas retórica. Mostrou ao mundo que desejava de fato aniquilar os judeus de Israel ao invadir pequenas cidades e aldeias e matar todas as pessoas que conseguisse. A ordem era “matar tantas pessoas quanto possível” [2]. Mas o seu culto de morte também envolve sacrificar o seu próprio povo, de acordo com o que está escrito em seu estatuto (artigo 15) [3]. A morte de israelenses é uma vitória do Hamas. A morte de palestinos em Gaza é também uma vitória para o Hamas, a qual repudiamos em igual medida.
É possível e desejável debater o conflito atual e suas origens, é possível e desejável criticar e repudiar atitudes das partes envolvidas, assim como os diversos crimes de guerra que tristemente estão sendo cometidos e que são injustificáveis. A diversidade de visões, opiniões e referências faz parte do debate saudável, da disputa política, e da legitimidade das críticas, que podem ser doloridas. Para piorar, há também uma guerra de narrativas, recheadas de notícias falsas e desinformação. Mas esse debate, pelo menos no âmbito universitário, deveria estar pautado pela veracidade dos fatos, e especialmente por princípios éticos fundamentais, como a dignidade humana, o valor da vida, a democracia, a igualdade entre as pessoas. Manifestações que tratam ações de grupos terroristas como uma forma legítima de emancipação não são compatíveis com anseios de paz.
Além disso, misturado com o discurso pró-palestino ocorre frequentemente uma negação da legitimidade de Israel. A preocupação com os direitos dos palestinos tem de ser equivalente à preocupação com o direito dos israelenses de existirem como nação. E que fique claro aqui novamente: apoiar a existência de um país não significa apoiar o atual governo (como aliás acontece atualmente com a maioria das pessoas em Israel, segundo as pesquisas de opinião), nem as políticas que vêm sendo adotadas durante anos. Infelizmente, assistimos novamente a cenas que têm se repetido por centenas de anos, à perseguição aos judeus estampada em um antissemitismo sistêmico: a crença de que os judeus são a única minoria que não precisa de proteção, o único povo que não tem direito à soberania, que Israel é não apenas o único país que não tem direito de se defender, mas o único que não tem direito de existir. Só isso justifica o lema “Palestina livre do rio ao mar”, um bordão não apenas antissionista, mas assumidamente genocida, pois significa expulsar (ou assassinar) todos os judeus de Israel. Depois do dia 7 de outubro, não há mais espaço para considerar este lema como um mero arroubo retórico, mas uma ameaça concreta.
Almejamos um futuro onde israelenses e palestinos possam conviver com autodeterminação e harmonia em uma solução de dois Estados. Somos contra governos autoritários e bélicos, e contra qualquer forma de racismo e discriminação. Gostaríamos de viver, e deixar para nossos descendentes, um mundo onde as diferenças étnicas, religiosas, políticas e de orientação sexual sejam respeitadas, e que todos possam lutar juntos por um planeta habitável em harmonia. Mas, infelizmente, assistimos a um brutal crescimento do antissemitismo e da islamofobia no Brasil e no Mundo. Estamos aterrorizados com as perspectivas de retorno de práticas que pareciam relegadas a filmes ou livros de histórias. Este texto é uma tentativa de expressar esse sentimento, na certeza de que o diálogo franco, respeitoso e livre de preconceitos é o único caminho para a paz.
[1] Ver, por exemplo,
https://avalon.law.yale.edu/20th_century/hamas.asp;
https://palwatch.org/page/6705
[2]
https://www.wsj.com/world/middle-east/hamas-fighters-orders-kill-as-many-people-as-possible-2a6abff8
[3]
https://avalon.law.yale.edu/20th_century/hamas.asp
Assine a manifestação pela vida e pela paz. Acesse este link
Assinaturas iniciais
Adriana Bin – FCA
Ana Regina Mizrahy Cuperschmid – FECFAU
Carlos Arturo Levi D’Ancona – FCM
Damian Alejandro Dzienciarsky – CEL
Élcio Lebensztayn – IMECC
Eric David Cohen – FCA
Fabio Bucaretchi – FCM
Helio Waldman – FEEC (aposentado)
Isa Etel Kopelman – IA
Jaime Portugheis – FT
Laura Rifo – IMECC
Laura Sterian Ward – FCM
Leandro R. Tessler – IFGW
Marcelo Firer – IMECC
Marcelo Knobel – IFGW
Márcio Seligmann-Silva – IEL
Martin Tygel – IMECC (aposentado)
Orna Messer Levin – IEL
Paulo José de Siqueira Tiné – IA
Ricardo Puccetti – LUME Teatro / COCEN
Roosevelt Cassorla – FCM (aposentado)
Tânia Maron Vichi Freire de Mello – SAPPE
Walter Carnielli – CLEHC/ COCEN
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Divulgação realizada por solicitação dos Professores Marcelo Knobel (IFGW) e Marcelo Firer (IMECC), na condição de sindicalizados à ADunicamp. As opiniões expressas nos textos assinados são de total responsabilidade do(a)s autore(a)s e não refletem necessariamente a posição oficial da ADunicamp, nem de qualquer uma de suas instâncias (Assembleia Geral, Conselho de Representantes e Diretoria).
Renato E. Simenauer
Concordo com o manifesto e enfatizo que Israel e o povo Judaico sempre reconheceram a necessidade da existência de um Estado Palestino. No entanto, somente haverá PAZ na região se os Estados Árabes e principalmente o Iran reconhecerem o Estado de Israel, oficialmente criado pela ONU e o Iran parar de financiar o terrorismo com o dinheiro do Petróleo (que pagamos ao comprar) lembrando que se não houver o Estado de Israel no Oriente Médio, o próximo passo serao os terroristas invadirem a Europa para implantar o sistema arcaico e ultrapassado de vida.