No Estado de São Paulo, ao longo das últimas duas décadas, as sucessivas gestões reitorais da Universidade Estadual Paulista, a serviço do governo do Estado e dos interesses da classe dominante, impuseram ao conjunto da comunidade acadêmica, uma política administrativa alicerçada em concepções de gestão institucional transpostas do universo produtivo, fabril e empresarial, para as esferas do ensino público superior e da produção do conhecimento científico. Orientada no sentido de atender às demandas do desenvolvimento econômico, essa administração atuou politicamente no sentido contrário à democratização dos processos decisórios.
Nesse sentido, a supressão da proporcionalidade paritária do voto nos colegiados centrais em meados da última década do século XX (LDB) – em favor da institucionalização de uma proporcionalidade fundamentada na supervalorização do voto dos servidores docentes (70%) em relação aos votos de servidores técnico-administrativos (15%) e estudantes (15%) –, abriu caminho para se instaurar as condições políticas necessárias à aprovação de uma série de medidas, que, em seu conjunto, levariam à perda da autonomia universitária, bem como ao colapso institucional vivenciado nos dias atuais. Medidas, estas, cujas repercussões mostraram-se nefastas para os rumos da universidade, tanto do ponto de vista orçamentário, quanto do comprometimento da qualidade do ensino, da produção do conhecimento científico e das atividades de extensão voltadas à comunidade, deteriorando, desse modo, o conjunto das atividades fins da universidade pública.
Como decorrência do processo de expansão sem a contrapartida dos recursos adequados, o enxugamento do corpo de servidores técnico-administrativos (– 8,5%) e a insignificante ampliação do corpo docente (6,7%), frente à ampliação desproporcional do contingente de estudantes de graduação (84,9%) e de pós-graduação (168,3%), associado às pressões produtivistas e à crescente burocratização do trabalho acadêmico, representou, não apenas uma considerável ampliação do volume de trabalho para o deficitário quadro de servidores docentes e técnico-administrativos, mas, sobretudo, um entrave para o desenvolvimento do trabalho científico, gerando condições insalubres para os trabalhadores dessa comunidade, tanto do ponto de vista da integridade física, quanto psíquica. Estes números, relativos ao período 1995-2014, constam no Anuário Estatístico da Unesp.
A transposição de concepções fabris de avaliação de desempenho para o âmbito da atividade acadêmica teve repercussões desastrosas, tanto do ponto de vista do empobrecimento da qualidade do trabalho desempenhado no âmbito da vida acadêmica, quanto do ponto de vista da desvalorização profissional, resultando em inúmeros casos de rebaixamento dos regimes de trabalho de docentes e confisco salarial, a partir de critérios puramente quantitativos.
O crescente investimento em tecnologias de informação e comunicação, a intensificação das contratações de professores substitutos – em detrimento da abertura de novos concursos para ampliação das contratações efetivas –, bem como outras formas precarizadas de contratação de trabalhadores,
atestam a vigência de um modelo empresarial pernicioso, tecnicista, baseado na intensificação do domínio sobre trabalhadores e estudantes, com vistas à elevação dos índices de produtividade com baixo custo, concomitantemente, ao rebaixamento salarial, à precarização das condições de trabalho, à subtração de direitos historicamente conquistados e à desvalorização acadêmica e profissional.
No bojo desse processo, a escalada da repressão aos movimentos políticos representativos dos diferentes segmentos da comunidade acadêmica da Unesp atingiu seu ponto culminante após a insurgência estudantil de 2013 e a derrota política imposta pelo movimento de trabalhadores grevistas ao Conselho dos Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp), ao final do dissídio coletivo de 2014. Dentro desse contexto, sob o amparo de um texto regimental ultrapassado, instituído durante o regime militar, os recentes ataques desferidos pela reitoria da Unesp contra participantes dos movimentos políticos, legitimamente representativos dos três segmentos constitutivos da comunidade acadêmica, reafirmam de forma irrefutável o caráter autoritário dessa gestão acadêmica.
Como forma de resolução dos conflitos políticos, decorrentes dessa gestão privatizante dos recursos públicos, o emprego do aparato repressivo do Estado, por parte dos gestores da Universidade, tornou-se prática recorrente, passando a fazer parte do nosso cotidiano, da mesma forma como o confisco dos salários de servidores grevistas, os processos de sindicância contra docentes e funcionários a partir de denúncia anônima, o assédio praticado contra servidores técnico-administrativos e os inúmeros episódios de repressão ao movimento estudantil, envolvendo pedidos de reintegração de posse, despejos, suspensões e expulsões de estudantes, sem o exercício do pleno direito à defesa, o que é gravíssimo!
Diante da incapacidade expressa da reitoria de solucionar as demandas da comunidade pela via da negociação política e democrática, conclamamos toda a comunidade acadêmica da Unesp a se unir numa luta consciente pela democratização efetiva desse patrimônio público de valor inestimável à população, colocando a universidade pública a serviço das demandas reais da sociedade por educação e conhecimento, ou seja, a serviço não só das necessidades de mercado, mas que faça germinar o que chamamos de um conhecimento socialmente necessário, gerando uma ciência e tecnologia que respondam fundamentalmente à totalidade das necessidades sociais, a serviço da humanidade. Conclamamos também a uma luta pela superação do aparato regimental proveniente dos porões da ditadura militar.
Com base nessas considerações, exigimos: imediata suspensão dos processos de sindicância, abertos a partir de denúncia anônima, contra os servidores docentes e técnico-administrativos da Faculdade de Ciência e Tecnologia do campus de Presidente Prudente; a revogação das expulsões dos 17 estudantes da Faculdade de Ciências e Letras do campus de Araraquara; a anulação da suspensão por 60 dias dos 95 estudantes dos diferentes campi; a revogação do caráter punitivo da avaliação docente; e a anulação dos rebaixamentos dos regimes de trabalho de docentes perpetrados pela Comissão Permanente de Avaliação.
São Paulo 23 de fevereiro de 2015
Diretoria Central da Adunesp
(Associação dos Docentes da Unesp – Seção Sindical do Andes-SN)
Diretoria Colegiada do Sintunesp
(Sindicato dos Trabalhadores da Unesp)
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